O seguro de automóvel e o princípio indenitário a impropriedade da oferta obrigatória do valor determinado

RICARDO BECHARA SANTOS 

 

É indubitável que o seguro de automóvel se submete às disposições que o Novo Código Civil reservou, no seu Capítulo XV, Seção II, para disciplinar os chamados seguros de dano, estes que, por sua vez, não podem nem devem se dissociar do princípio indenitário que, no Brasil e no Mundo, rege, de forma absoluta, todos aqueles seguros em que é inadmissível o pagamento de sinistro por valor que supere o efetivo prejuízo experimentado pelo segurado, prejuízo este representado pelo valor de mercado do bem e que baliza o interesse legítimo segurável a que alude o at. 757 do Código Civil. Por isso o princípio indenitário, plasmado nos arts. 778, 781 e 782 do Código, é essencial, não só para impedir que o sinistro passe a interessar ao segurado e evitar a pecha do enriquecimento ilícito e sem causa, como também para não fomentar a fraude, esse mal que tanto mina e assola a instituição do seguro.

 

Vale, nesse propósito fazermos algumas considerações de ordem geral, destacando que a principal peculiaridade que distingue os seguros de dano dos seguros de pessoa é exatamente o caráter indenitário dos primeiros.

 

O só fato de se poder estabelecer um limite para a “indenização”, que é a prestação do segurador nos seguros de dano, seria o suficiente para arredá-la dos cânones comuns da responsabilidade civil, afastado que estaria, por exemplo, o nemnem laedere, dentre outros princípios que, como viscera pars, informam e conformam o instituto da responsabilidade civil, tais como o do honest vivere, suum cuique tribuere, restitutio in integro etc. A responsabilidade civil e toda a sua estrutura de reparação de dano, pois, há de estar a serviço da instituição do seguro, até como “produto” (seguros de Responsabilidade Civil de auto, de condomínio, de produto, de profissional, geral, enfim), jamais como seu “karma”… Tanto assim que o seguro de responsabilidade civil vem tratado como tal nos artigos 787 e 788 da Seção II do Capítulo XV do Código Civil, reservada aos seguros de dano.

 

Com efeito, o contrato de seguro de dano tem mesmo inegável caráter indenizatório. Nem por isso lhe é retirada a índole aleatória. Até porque, essa indenização (artigo 776 e outros do NCC) depende, de qualquer forma, de um acontecimento futuro e incerto. É um caráter indenitário, vale reiterar, dissociado dos princípios comuns que regem o instituto da responsabilidade civil, a começar pelo fato de que o segurador não substitui o causador do dano, seja ele terceiro ou o próprio segurado, e também pelo fato de não ser o segurador autor de qualquer ato ilícito. Contra ele não vale, por exemplo, a regra do restitutio in integro, justamente porque a sua dívida não é de valor, mas de dinheiro conforme limites estabelecidos no contrato (NCC, art. 776).

 

Por razão semelhante, a manifesta índole indenizatória do seguro de dano o distingue dos seguros de pessoa, tanto que nestes, além da liberdade de se estabelecer, em regra sem limites, o capital segurado justo porque a vida humana seria insuscetível de avaliação econômica, é expressamente vedada a sub-rogação do segurador para promover o ressarcimento do que pagou ao segurado contra um eventual causador do dano pessoal, ao contrário do que sucede nos seguros de dano em que a sub-rogação é expressamente prevista (art. 786), por isso que no seguro de dano o segurado só recebe o valor dos os prejuízos comprovados, enquanto que no seguro de pessoa não se trata de verificar o montante dos prejuízos, paga-se o valor consignado na apólice, estimado arbitrariamente pelo segurado no momento da conclusão do contrato, enquanto que nos seguros de dano esse valor é limitado ao valor real do bem ou do prejuízo.

 

Nessa mesma ordem lógica, o novo Código primou por uma maior clareza ao estabelecer os limites, que, em hipótese alguma, podem ser ultrapassados na conclusão do contrato (art. 778) e na sua execução (art. 781), não havendo mais espaço, salvo as exceções pertinentes (valor de novo e bens de valor histórico), por exemplo, para a contratação do seguro de automóvel por Valor Determinado, mas por Valor de Mercado, que representa o prejuízo indenizável, salvo também nas hipóteses excepcionais em que não haja cotações de mercado.

 

Cumpre notar, com destaque, que o art. 781 estabelece dois limites para os seguros de dano, primeiro o limite do próprio prejuízo experimentado pelo segurado, segundo o limite máximo de garantia que em hipótese alguma pode ser ultrapassado, dando a idéia de que o primeiro limite até que poderia ser transposto. Realmente, o legislador, com tal construção, abre alas para que, excepcionalmente, o seguro de dano possa indenizar bens onde inexista um padrão Standard de cotação de mercado, como por exemplo, no seguro de automóvel, os carros de coleção, desde que, certamente, o limite máximo de garantia seja previamente ajustado de comum acordo entre as partes de modo a coincidir com o valor determinado para indenização, como que se o interesse legítimo segurado seja satisfeito naquele valor ajustado. Outro exemplo que se comporta nessa exceção seria a indenização por valor de novo. Nessas exceções poderia se justificar a faculdade estabelecida na Circular nº 241/04 da SUSEP para oferta de contratação por Valor Determinado.

 

Vale ponderar que a cláusula de Valor de Mercado, devidamente aprovada pela Superintendência de Seguros Privados – SUSEP, além de consentânea com a disciplina bem mais clara do novo Código Civil, também não ostenta, em nenhum ponto, contra os cânones do Código de Defesa do Consumidor – CDC, que também de forma alguma impõe a oferta obrigatória pelas seguradoras do Valor Determinado, salvo quando muito para acolher a demanda das exceções antes mencionadas.

 

Certos também estamos de que o CDC, que obviamente teve o importante propósito de melhorar as relações de consumo, e não o de resolver as ilusões de cada um de nós, não teria vindo à luz para alterar as fórmulas e a essência dos contratos típicos disciplinados no Código Civil, dentre eles o contrato de seguro, que tem por apanágio, por essência mesmo como já se viu e repetiu, a delimitação do risco, por isso que a cláusula em exame nada mais é do que uma restrição lícita e admitida, inclusive pelo CDC (artigo 54, § 4º), assim posta, nos termos do artigo 1.437 do Código Civil revogado, e, agora, em consonância imperiosa com os arts. 778, 781 e 782 do Código novo, em perfeita e fina sintonia com o caráter indenitário do contrato de seguro de dano.

 

A natureza indenizatória do contrato de seguro, com efeito, inadmite ao segurado receber indenização acima do dano efetivamente experimentado e no caso representado pelo valor de mercado do veículo, importância com a qual o segurado, em caso de sinistro, poderá adquirir outro veículo equivalente, já que o seguro, de damnum vittando e não de lucro capiendo, não se filia à possibilidade de propiciar maior vantagem ao segurado em face do sinistro. Caso contrário, inviável seria a instituição do seguro, na medida em que o sinistro, acontecimento futuro e incerto, pois a álea é aba essencial do contrato de seguro, passaria a interessar ao segurado, atuando como forte indutor de fraude. E esse efeito poderia não ser sentido de imediato, mas a médio prazo já passaria a se ressentir de seus efeitos vizinhos, que já dão mostras pelo crescente nível de sinistralidade nesse curto período de convivência com a contratação do seguro de automóvel por “Valor Determinado”, que já começa a espargir, essa quebra de princípio, para outros seguros de dano em que a condenação das seguradoras sempre pelo valor máximo indicado na apólice é de conseqüência ainda mais severa, como é o caso, dentre outros, do seguro de incêndio, cujo desvio do princípio indenitário será fatal para a respectiva carteira e, por conseguinte, para a mutualidade, para a coletividade de consumidores de seguro, enfim.

 

Seria irônico admitir que a revolução jurídica trazida pelo CDC para equilibrar as relações contratuais, pudesse atuar para desequilibrar essa balança no sentido oposto, ou seja, para favorecer somente o consumidor na sua individualidade, uma das partes do contrato bilateral de seguro. Eis que, sendo o equilíbrio o limite, ultrapassá-lo significa ameaçar outro princípio maior, e constitucional, que é o da “Segurança Jurídica”, que garante a estabilidade das instituições.

 

Note-se que o prêmio, importância paga pelo segurado, menor que o valor do dano em caso de sinistro, e que consiste na função do risco, é calculado também levando em conta a conhecida depreciação do veículo decretada pela lei da oferta e da procura, no curso da apólice, sendo certo que no momento da contratação a Importância Segurada, hoje na terminologia do NCC mais propriamente denominada de Limite de Garantia, que funciona apenas como limite máximo de indenização, coincide com o valor de mercado. Limite máximo esse que tem, por exemplo, a função de balizar uma alteração como a que ocorreu com os carros importados em face da desvalorização do Real frente ao Dólar, que ao contrário dos veículos nacionais, em dado momento não teve a projetada desvalorização. Tanto assim, que o prêmio cobrado na contratação por Valor Determinado é substancialmente mais elevado que na contratação por Valor de Mercado, de maior custo portanto para o consumidor posto que não levará em conta a desvalorização do veículo.

 

Permitimo-nos, sem qualquer outro propósito, como ilustração ao quanto aqui ponderamos em apertada síntese, submeter ao caro leitor, passos mais adiante, alguns flashes de trabalho percuciente de doutrina do Ministro ATHOS GUSMÃO CARNEIRO, que, do alto de sua imensa sabedoria e judiciosidade, esgota o tema aqui tratado. Também escólios de não menos elevada altura, do Ministro CÉLIO BORJA, que com invulgar mestria também corta rente, com ponta diamantina, alguns bolsões de dúvidas que ainda pudessem restar.

 

Nesse mesmo propósito, permitam-nos lembrar de que existe uma miríade de outros tantos pronunciamentos doutrinários e de jurisprudência copiosa em prol da legitimidade da cláusula de valor de mercado e do princípio indenitário que repele a contratação por Valor Determinado, que certamente será restabelecida diante da clareza solar e da precisão técnica com que se houve o novo Código Civil ao tratar do contrato de seguro, mormente no que tange ao princípio indenitário do seguro de dano que inadmite o sobejamento dos limites indenizatórios ali tracejados.

 

Da mesma forma, permitimo-nos lembrar dos pareceres da douta Procuradoria Geral da SUSEP, tanto ao tempo do revogado Código de 1916, da lavra do ilustre Dr. ANDRÉ FAORO (Parecer exarado pela Carta SUSEP/GABIN Nº 015, de 08/04/99), que conclui pela legitimidade da cláusula, esta que, concessa magna venia, não traz consigo qualquer ranço de abusividade, como também ao tempo do novo Código, conforme parecer da lavra do não menos ilustre Dr. RAUL TEIXEIRA (Parecer/SUSEP/PRGER/GAB/RT/Nº 13.943/2003, datado de 24/02/03, recepcionado como Parecer Normativo pela Deliberação SUSEP nº 84, de 11/03/2003, publicado no DOU de 26/03/2003, páginas 39/46), que chega também a ser categórico na conclusão de que a nova ordem do princípio indenitário do Código Civil de 2002 não comporta outra modalidade de contratação de seguro de dano do tipo automóvel senão com a cláusula de Valor de Mercado, ressalvando as exceções para os veículos de valor histórico, obras de arte, enfim, que pela falta de um parâmetro de cotação de mercado, se permite, excepcionalmente, a contratação por Valor Determinado.

 

 

 

 

ALGO MAIS SOBRE O CARÁTER INDENITÁRIO DO SEGURO DE DANO.

 

É fundamental, como já se viu por óbvio, o princípio indenitário no Seguro de Dano, dentre os quais se insere o de automóvel, o de incêndio, o de garantia, o de transporte, o de responsabilidade civil, enfim, todos os seguros de natureza patrimonial que não sejam os seguros de vida e de acidentes pessoais definidos na Seção III do novo Código reservada aos seguros de pessoa. São de dano todos os seguros de caráter indenitário em que o interesse legítimo segurável, objeto do contrato, incide sobre um bem apreciável economicamente, pelo qual se indeniza o prejuízo que o segurado efetivamente sofreu, cujas peculiaridades são, sem discrepâncias, definidas pela doutrina, brasileira e mundial.

 

Em nossa obra “Direito de Seguro no Cotidiano”, quando ainda vigia o Código Civil de 1916, já advertíamos que:

 

“É da essência do contrato de seguro a seletividade do risco, por isso que o código civil, em seu artigo 1.460 (também no art. 757 do NCC), dentre outros, estabelece que limitados os riscos cobertos, por outros não responderá o segurador. Pois é do próprio CDC, que se extrai a permissão para as cláusulas restritivas ao direito do consumidor, bastando sejam elas redigidas com destaque e clareza, tal como aliás é feito, sem qualquer conotação de cláusula abusiva. Pois abusivo seria pretender o segurado receber indenização maior do que o seu prejuízo. Pudesse ele receber quantia maior que o prejuízo estaria, não só ofendendo o artigo 1.437(equivalente ao art. 782 do NCC) do Código Civil, como também especulando em detrimento do seguro, pois o sinistro passaria a interessar ao segurado na medida em que possa ele prever o recebimento de quantia maior do que o valor de compra de outro bem igual ao sinistrado.

 

A regra hasteada no artigo 1.437 do CC (art. 782 do NCC), segundo a qual não se pode segurar uma coisa por mais que valha, não é nenhum capricho ou invencionice da lei brasileira mas regra universal do direito de seguro.

 

E assim o é por razões óbvias, irretorquíveis, já que a indenização do seguro tem caráter estritamente reparatório e, como tal, não pode ultrapassar o valor do interesse legítimo sobre a coisa segurada, por isso que qualquer excedente constituir-se-á vantagem ilícita e sem causa.

 

A cláusula que limita a indenização ao valor do prejuízo, encarnada nas apólices de seguro de dano, dentre elas a de auto, importa também em obstáculo à fraude, arquiinimiga da instituição de seguro, que acaba onerando a própria mutualidade, além de consistir em fonte de especulação por parte do segurado desonesto.

 

Não pode nem deve colher frutos o argumento, inconsistente, que costuma se invocar para tisnar de abusiva e nula a cláusula, qual o de que o prêmio foi pago com base na IS.  É que o prêmio, preço da cobertura (garantia), ou preço do risco assumido pela seguradora, é projetado para a garantia reparatória do dano. Por isso que IS e valor de mercado devem coincidir no início do contrato, por indicação do próprio segurado.  Se, no curso do contrato o mercado de automóveis decreta a queda da cotação, por razões alheias à vontade e determinação do segurador, o momento da perda total por sinistro é que deve determinar o valor da indenização devida pela seguradora.

 

Essas são também algumas das razões que distinguem o seguro do jogo e da aposta.  A cláusula de valor de mercado, que impede o segurado de apostar no sinistro, preserva a necessária distinção entre os dois institutos.

 

Observa-se também que a IS não estaria a serviço apenas de um sinistro de perda total.  É que no risco de casco (do próprio veículo) a IS é válida para cada sinistro isoladamente.  Não é incomum, que durante o contrato o segurador venha a ter que pagar mais do que o valor do veículo.  Basta que o segurado venha colidir sucessivas vezes.  O somatório das indenizações para conserto de seu veículo, pode suplantar o valor da IS.  Demais, o segurado pode ainda ter o seu carro roubado ou furtado.  “E o furto, roubo ou acidente podem acontecer no início do contrato, onde provavelmente o segurado irá receber o total dos IS”.

 

O inexcedível PEDRO ALVIM já explicava, de há muito, também para deixar estreme de dúvida que o princípio indenitário, que impregna indelevelmente os seguros de dano, não admite possa o segurado receber indenização além do efetivo prejuízo por ele experimentado, tampouco superar o limite máximo da garantia, eis que, do contrário, não estaríamos falando de indenização, mas de locupletamento sem causa, ou confundindo o seguro de dano com o seguro de pessoa onde não há limites, mas um capital segurado livremente estipulado:

 

“É da maior importância a divisão de seguros de dano e de pessoas. Constituem dois grupos com estruturação técnica diferente. Não coincidem também seus objetivos.

 

Um tem caráter indenitário, o outro não.  A peculiaridade de cada grupo reflete na sua disciplina jurídica.

 

Os seguros de dano são conhecidos como seguros de coisas, denominação que tem sido abandonada pelos autores, porque se refere apenas a algumas espécies de seguros em grupo.  São seguros de coisa o de incêndio, de transportes, de automóveis etc., mas não se incluem aí os de responsabilidade civil, de garantia, de fidelidade e outros.  A expressão “seguros de dano” é mais abrangente e envolve todos eles.  Refere-se tanto aos prejuízos materiais como à perda de valores patrimoniais.

 

Há um princípio que domina todos os seguros de dano qualquer que seja sua modalidade de cobertura: ninguém pode lucrar com o evento danoso ou tirar proveito de um sinistro.

 

Deverá receber em dinheiro ou espécie aquilo que perdeu.   O pagamento a mais pode servir de estímulo à fraude ou à especulação, por isso a legislação de todos os povos fulmina de nulidade o seguro de valor superior ao do bem.  Figura em nosso Código Civil: “Não se pode segurar uma coisa por mais do que valha, nem pelo seu todo mais de uma vez”(art. 1.437).

 

Eis por que se diz que os seguros de dano têm por objetivo uma indenização, isto é uma reparação, compensação ou satisfação de um dano sofrido.  O segurado deverá receber o que for necessário para repor a situação anterior à ocorrência.  Ressarcir-se de seus prejuízos.”

 

O Eminente e acatado ministro CÉLIO BORJA, em irrepreensível parecer de 24 páginas sobre o tema, datado de 07/10/99 (in Boletim SULAJUR – 17, RJ – OUTUBRO/99, páginas 117/140, editado pela Superintendência de Relações Jurídicas da Sul América Seguros), anota, com seu toque refinado de jurista de escol, que “essa peculiaridade decorre da organização mutualística da economia do seguro” e, citando o não menos ilustre SILVIO RODRIGUES, explica “a mutualidade como atributo essencial do seguro, vendo na empresa seguradora privada uma intermediária que, recolhendo os prêmios pagos pelos segurados, usa desses recursos, e só deles para pagar as indenizações pelos sinistros ocorridos. De modo que são os próprios segurados que pagam as indenizações devidas

 

Para que o valor da indenização não exceda o do prejuízo, “em muitos seguros, como por exemplo, no de automóveis ou no de incêndio de imóveis, o segurador ressalva o direito de mandar reparar o veículo ou de reconstruir o prédio, conforme prefira”.

 

Tudo isso, pondere-se, se os eventos futuros e incertos se comportarem dentro da quantidade (freqüência) e valores (indenizações), que foram previstos pelo segurador para o cálculo do prêmio.

 

Observe-se ademais, que, além de gestor da mutualidade, o segurador subscreve riscos incertos e futuros para os indivíduos, que para ele segurador são minorados na medida em que se valeu da experiência ditada pela lei dos “grandes números”.

 

Quaisquer desvios nessa projeção atuarial do segurador são indesejáveis tanto para o segurador quanto para a mutualidade, porém factíveis pela própria álea, inclusive em decorrência de fatores sócio-econômicos imprevisíveis no País.

 

Dentre os desvios, que devem ser coibidos, estaria o de os participantes da mutualidade virem a ter interesse na ocorrência ou agravamento de sinistros.

 

Atente-se para o fato de que o segurador só poderia tentar recuperar ou minimizar os efeitos negativos de tais desvios somente no futuro, ou seja, para os novos segurados e, jamais, com relação aos riscos já antes subscritos.

 

Tratando-se de seguro facultativo, extremamente sensível a preços, a elevação dos sinistros só causa danos ao consumidor, além de conspirar contra os objetivos da massificação do seguro de automóvel, por exemplo.

 

Observe-se ainda, que a massificação e universalização do seguro de automóvel traz grandes benefícios de preços aos consumidores, uma vez que a escala reduz custos administrativos e torna estatisticamente mais previsíveis os riscos assumidos.

 

Daí a imperiosa importância de se respeitar, rigorosamente, cada cláusula contratual, estabelecida sem qualquer abusividade, tendo razão PEDRO ALVIM ao ensinar que a interpretação no contrato de seguro há de ser sempre restritiva.

 

Ao contrário, as cláusulas e condições plasmadas no contrato de seguro, como admite o Código de Defesa do Consumidor, são apenas restritivas, como apanágio da natureza aleatória do contrato de seguro, pois a delimitação do risco em toda a sua extensão no contrato é de sua essência, por isso que em benefício da estabilidade que interessa sobremaneira à mutualidade. Sem o que o seguro seria tecnicamente inviável.

 

E é através dessa delimitação do risco, aí incluindo a cláusula de valor de mercado, que o segurador, gestor do mutualismo, tenta minimizar o desejo pelo sinistro, domar a sanha quase incontrolável dos praticantes da “Lei de Gerson”, ou seja, que o segurado persevere temendo o risco, se comportando como se seguro não tivesse realizado.

 

Note-se que o seguro de automóvel no Brasil, tem a vanguarda de tomar como parâmetro para indenização ao segurado o valor de mercado pelo preço de compra de outro veículo equivalente, e não, como sucede em outros países, pelo preço em que tal veículo pudesse ser vendido pelo segurado se não houvesse sinistro. Vale dizer, se o segurado vendesse o seu veículo, apuraria valor menor do que a indenização que recebe da seguradora em caso de sinistro contratado pelo valor de mercado.

 

A propósito, vale transcrever os excertos, irrespondíveis, que são fruto da precisão do raciocínio jurídico e lógico do Ministro e jurista CÉLIO BORJA, no antes citado Parecer, ao explicar que a limitação da indenização ao valor do efetivo prejuízo que venha a sofrer o segurado, é, antes que tudo, corolário dos seguros de dano, razão inclusive pela qual não se pode jamais conceber que esse limite possa ser visto como ofensivo ao princípio da Resolução Por Excessiva Onerosidade, trazido à baila pelo Código de Defesa do Consumidor e, já agora, pelo Novo Código Civil, em seus artigos 478/480. Senão vejamos as lúcidas ponderações do Ministro, in verbis:

 

“Tanto a Lei nº 8.078, de 1990, quanto o Decreto nº 2.181, de 1997, definem como desvantagem exagerada do consumidor a obrigação excessivamente onerosa. Ora, não pode ser excessivamente onerosa para o consumidor a pactuação de um prêmio cujo valor, nas palavras de GASPERONI, é calculado exatamente “em relação às probabilidades de o sinistro vir a ocorrer, quando se tem em vista uma ampla massa de riscos homogêneos.” E que obriga o segurador a indenizar o sinistro pelo valor médio de mercado, substituindo, portanto, o bem sinistrado por seu equivalente. Mesmo conceitualmente, essas estipulações não se ajustam ao que a doutrina nacional e estrangeira entende ser uma obrigação excessivamente onerosa..

 

Quando a excessiva onerosidade da obrigação é ínsita à sua estipulação originária, as opiniões se dividem, entendendo uns que ela, nesse caso, corresponde à lesão, que o direito anterior ao Código Civil classificava como vício do negócio jurídico, facultando ao lesado pedir ao juiz a sua resolução ou exigir reparação compensadora, nas palavras de CLOVIS BEVILAQUA.

 

Diversamente, a resolução por excessiva onerosidade da obrigação tem em mira, sobretudo, os contratos de longa duração e os de trato sucessivo, nos quais as condições existentes, na época da celebração, estão sujeitas a modificações tais que impossibilitam ou tornam economicamente desastroso cumprir aquilo que se prometeu.

 

A teoria da imprevisão, a fim de evitar ou obviar o risco de injustificadas inexecuções contratuais, adiciona a imprevisibilidade aos demais requisitos de validade da cláusula rebus sic stantibus: prestação diferida ou de trato sucessivo, modificação economicamente relevante das condições objetivas da execução do contrato e, tomando à lesão a nota essencial do seu conceito, pressupõe que da extrema onerosidade da prestação de uma das partes resulte o enriquecimento da outra – enriquecimento a expensas de outrem.

 

Não é possível, portanto, assimilar ou correlacionar a excessiva onerosidade que resulta da imprevisibilidade de um fato futuro à previsibilidade que determina os valores do prêmio do seguro e o da indenização do sinistro.”

 

Com efeito, a cláusula do contrato de seguro que estipula o valor do prêmio em função do risco delimitado no contrato e na lei não pode, portanto, ser unilateralmente modificada, nem se presume ofensiva do sistema de seguro, muito ao contrário, nem comprometedora do equilíbrio contratual ou excessivamente onerosa para o segurado, até porque resulta da lei e da lógica do seguro, afinal, o princípio indenitário é da essência dos seguros de dano e impõe limites a serem observados, conforme estabelecidos nos artigos 778 e 781 do novo Código Civil. Tampouco poderia se falar em Enriquecimento Às Expensas De Outrem, como elucida, mais uma vez, o festejado CÉLIO BORJA, no mesmo Parecer antes citado, verbis:

 

“Ora, nos contratos de seguros privados em que se estipulam prêmios tarifados pela autoridade pública, presume-se, repito, que os valores respectivos foram calculados e fixados “em relação às probabilidades de o sinistro vir a ocorrer”, tendo em vista “uma ampla massa de riscos homogêneos”. E a tarifa autoriza e limita a margem de lucro do segurador, que não pode ser por ele aumentada. Em conseqüência, não é possível vislumbrar nem a extrema onerosidade, nem o enriquecimento do segurador a expensas do segurado, para justificar a inclusão da indenização pelo valor de mercado no rol das cláusulas contratuais abusivas.

 

Para SAVATIER, nessa modalidade de enriquecimento o valor perdido pelo patrimônio de um indivíduo deverá transformar-se, materialmente, em valor ganho pelo patrimônio de outrem.

 

Para FRANÇOIS GORÉ, basta que o enriquecimento e o empobrecimento sejam determinados por uma mesma causa (“um lien de corrélation qui est um élement indépendant de l’enrichissement au dépens d’autrui et qui existe quand l’appauvrissement et l’enrichissement ont une même cause”), ainda que se relacionando de diferentes maneiras: 1) empobrecimento correlativo; 2) indivisibilidade de origem; 3) vínculo de causalidade ou origem; 4) vínculo de conexão; 5) relação de causa e efeito.

 

É exemplo de enriquecimento a expensas de outrem, o contrato de compra e venda – comutativo, enquanto o de seguro é aleatório – que aporta ao patrimônio do vendedor um valor muito maior do que aquele que dele saiu e empobrece o comprador, porque do seu ativo saiu um valor muito superior ao que entrou.  A questão que, então, surge é a de saber se é necessário que o enriquecimento resulte de uma falta do beneficiário ou de ato injurídico, para que aquele que se empobrece possa intentar a ação própria – in rem verso.  Parece que não, porque o ato ilícito gera a responsabilidade civil do agente que é objeto de ação específica, mediante a qual se buscam outras vantagens além da reposição do quantum diretamente perdido.  Já na ação de in rem verso limita-se o pedido ao quantum do enriquecimento que corresponde ao empobrecimento do demandante.

Aplica-se a essa situação econômica a proposição jurídica desenvolvida por FRANÇOIS GORÉ, segundo a qual o enriquecimento tanto pode resultar de uma economia de despesas que se supunham inevitáveis – como pode ocorrer na economia do seguro pela competente administração dos ativos e passivos da companhia seguradora – como de um ato ou fato que evita a ocorrência de uma perda patrimonial.”

 

Como bem assinalou o também Ministro e Professor, ATHOS GUSMÃO CARNEIRO, em excelente artigo de doutrina sobre a natureza indenitária do seguro de dano, publicado na Revista dos Tribunais (RT-769-NOVEMBRO/99 – ANO 88 – p. 120-134), é equívoco supor que o prêmio do seguro de dano seja calculado sobre o valor indicado como Limite Máximo de Indenização (LMI) constante da apólice, antes denominado, embora imperfeitamente, de Importância Segurada (IS). O valor do prêmio, assinala o Ministro, não é calculado tendo em consideração um contrato de seguro, mas sim tendo em vista a lei dos grandes números.

 

Em suas notas, percebe o Ministro o pressuposto incontroverso, inerente à própria estrutura do contrato de seguro, “de que a Seguradora constitui um fundo, suprido pelos prêmios a serem pagos pelos segurados, fundo este suficiente para cobrir os sinistros que, tendo em vista cálculos objetivos de probabilidades, devam ocorrer no grupo segurado”. E traz o testemunho doutrinário do mestre  ARNOLD WALD:  “O  seguro  generalizado importa em diluir sobre um grande número de pessoas os encargos decorrentes de uma infelicidade individual, socializando assim a responsabilidade, como salientou  René Savatier nas suas Métamorphoses économiques et sociales du droit civil d’aujourd’hui – 2ª. Ed. , Paris: Dalloz, 1952, 1ª Série. P. 247 et seq.-” (Obrigações e Contratos.  9ª ed. , São Paulo: Ed. RT,  1990, n. 208.1). Para em seguida concluir que o prêmio de seguro não representa, de modo algum, para o segurador, a contrapartida do risco assumido em determinado contrato, mas sim a cota-parte cabível ao segurado na repartição do montante global dos riscos que pesam sobre a mutualidade” (RT 759/89).

 

Com PEDRO ALVIM arremata que “Os riscos são aí considerados não isoladamente, mas no seu conjunto, isto é, não se leva em conta a situação de cada segurado, mas a massa de segurados que irá contribuir para a formação do fundo comum” (p. 295).

 

Já se envolvendo na lógica matemática do seguro para o cálculo do prêmio, e bem compreendendo a questão, chega o antes citado Ministro, em certo ponto de suas considerações doutrinárias constantes do seu parecer também acima mencionado, ao requinte do exemplo, assinalando, literis:

 

“Vamos supor, pois, um grupo de cem riscos, de cem contratos de seguro facultativo de automóveis, com valor segurado (valor máximo de indenização) de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) cada um, vindo a cobrir por um ano eventuais prejuízos decorrentes de danos e de perda total do veículo.

 

Como será calculado o prêmio a ser pago pelos segurados?

 

Consoante os níveis médios de probabilidades (variáveis inclusive conforme o local – v.g., atualmente no Rio de Janeiro o risco é muito maior), digamos que no prazo anuo irão acontecer:

 

  1. a) três casos de danos parciais, importando em indenizações de R$ 1.000,00 a cada segurado:
  2. b) dois casos de danos mais graves, com indenização de R$ 7.500,00 a cada segurado.
  3. c) Dois casos de furto, com perda total, indenizados pelo valor de mercado de R$ 15.000,00 a cada segurado.

 

Assim apenas para indenizar os danos parciais mais leves, que somaram R$ 3.000,00.  Cada um dos cem segurados teria, em rateio, de arcar com um prêmio de R$ 30.00; apenas para ressarcir os danos mais graves, que somaram R$ 15.000,00, cada segurado teria de arcar com um prêmio de R$150,00: apenas para cobrir os dois casos de perda total, que somaram R$30.000,00. Cada segurado teria de desembolsar um prêmio no valor de R$300,00. Teremos, pois, de início, a necessidade de cada segurado, no rateio, arcar com um prêmio de R$480,00.

 

Cumpre supor, no entanto, que a seguradora consiga receber “salvados”(parte ou peças recuperadas) num valor de R$10.000,00.  Este valor irá a crédito do conjunto de segurados, importando, para cada um deles, numa diminuição em R$100,00 do valor do prêmio, assim reduzido a R$ 380,00.

 

De outra parte, existem várias despesas a cargo da seguradora. Assim a comissão do corretor de seguros (de participação legalmente obrigatória), que importa em 20% sobre o valor “final” do prêmio, as despesas operacionais da própria seguradora, que importam em 15% sobre o valor “final” dos prêmios e, finalmente, o lucro da seguradora, no percentual de 5% sobre o valor “final” dos prêmios.

 

Em suma e ao final, o contrato deverá estabelecer o pagamento do prêmio de R$ 633,33, para o valor máximo de indenização de R$ 20.000,00.

 

Como vimos, o montante do prêmio será calculado com vista a uma série de fatores, dos quais o “valor máximo segurado” é apenas um deles.

 

Por que, então, a menção ao “valor segurado”(rectius, ao  “valor máximo” da  indenização) no corpo da apólice?

 

Ocorre o seguinte: o valor segurado é válido relativamente a cada um dos possíveis acidentes ou perdas que o veículo venha a sofrer durante o tempo de vigência do contrato.

 

A cobertura da apólice é compreensiva, cobrindo também as perdas parciais, mesmo se sucessivas.

 

Assim, se o veículo, estando previsto na apólice um valor máximo de indenização de R$ 20.000,00, é danificado em um primeiro acidente, do qual resulte a indenização de R$ 3.000,00, o veículo continuará segurado por R$ 20.000,00, e não pelo “saldo” de R$ 17.000,00, como alguns supõem.

 

Ocorre um segundo acidente, mais grave, cuja indenização importe em R$ 10.000,00 mas o veículo prossegue segurado pelos R$ 20.000,00, e não apenas por R$ 7.000,00.

 

Mais tarde, digamos que o veículo venha a ser furtado. Seu “valor de mercado”, de R$ 15.000,00 será integralmente pago ao segurado, embora o total das indenizações já tenha passado a somar R$ 28.000,00!

 

Note-se, ainda, que para a manutenção do valor máximo, apesar dos sucessivos sinistros, as seguradoras não cobram prêmio adicional.  E somente quando o último sinistro implicar indenizações que somada às anteriores, resulte em ultrapassagem do valor máximo, é que a apólice será cancelada.

 

Nesta limitação dos riscos inclui-se a cláusula referente ao “valor de mercado”, pela qual o segurador, como gestor do mutualismo, inclusive previne eventuais desvios de comportamento dos segurados, a fim de que estes perseverem temendo a superveniência dos riscos e comportando-se com cuidado, como se não houvessem contratado o seguro.”

 

A indenização pelo “valor de mercado”, apurado com a objetividade referida nos contratos de seguro, não só realizará o “princípio indenitário”, como fará com que a fraude seja menos rentável e, pois, menos estimulada. E hoje a adoção da Tabela FIPE, inexoravelmente, deixa para traz as dificuldades que antes existiam para se apurar o valor de mercado.

 

As perdas parciais, como notório, resultam proporcionalmente mais onerosas às seguradoras que as perdas totais, pois sua reparação costuma ser feita por peças novas originais.

 

Sabemos, também, que a reposição das peças, uma a uma, implica custo maior do que a reposição de um carro total. A conferência dos preços das peças demonstra tal disparate, até porque os incentivos fiscais de que gozam os veículos não são extensivos às suas peças de reposição. Assim, a reposição parcial de peças totaliza o correspondente a quase 5 vezes o valor do veículo “zero quilômetro”!  Este fato faz com que a “indústria dos desmanches” resulte em altos lucros, e sejam pagos altos preços pelos veículos furtados ou vendidos fraudulentamente. E isso, também percebeu, com inescondível sabedoria e muita argúcia, o Ministro ATHOS GUSMÃO CARNEIRO, na sua excelente dissertação sobre o tema.

 

O eminente Ministro, em seu bem lançado parecer, nos honra com a menção que faz a trecho de artigo de nossa lavra, publicado na Revista do IRB – Abril-junho/1996, ao sustentar que o seguro de dano, ou de coisas como também ali se refere, “TEM NATUREZA ESSENCIALMENTE INDENIZATÓRIA, NÃO AUTORIZANDO A CAPTAÇÃO DE LUCROS POR PARTE DO SGURADO”:

 

“O seguro é de dannum vitando, e não de lucro capiendo, respeitadas, evidentemente, as cláusulas e condições contratuais” (sic).  Se assim não fora, e se o segurador devesse sempre ressarcir pelo valor máximo indicado pelo segurado, então, face à desvalorização do bem objeto do seguro. Pelo tempo ou pelo uso, decerto que iria ele sempre torcer para que o sinistro acontecesse”(Ricardo Bechara Santos, in Revista do IRB.  Abril-junho1996).

 

A atividade do segurador, como bem expõe FÁBIO KONDER COMPARATO (Comentário, RDM, nº 7, ano XI, São Paulo: Ed. RT, nova série, 1972, p. 108 – 110), consiste exatamente em organizar uma mutualidade (agrupamento de pessoas sujeitas ao mesmo risco), segundo as exigências atuariais de compensação do conjunto de sinistros previsíveis pela soma total das contribuições a serem pagas pelos segurados.  Consoante o magistério de FERRI, “a relação entre prestação e contraprestação não se coloca com referência a um seguro isolado, mas em relação à massa dos seguros daquele tipo realizados pela empresa” (Manuale di Diritto Commerciale, 2.ª d. , p. 720).

 

PEDRO ALVIM, conceituadíssimo estudioso da matéria, assim se manifestou:

 

“Quando a importância segurada, em vez de ser pré-fixada, é apenas estimada pelo segurado, o que ocorre em vários ramos, como, por exemplo, automóvel, incêndio e responsabilidade civil, constitui o limite máximo de responsabilidade do segurador, desde que não supere o valor do bem. Não fica ele obrigado ao pagamento daquela quantia, mas até aquela quantia, dependendo de prova dos prejuízos efetivos. É que não houve uma avaliação a priori, mas somente uma estimativa unilateral do segurado”. (Grifamos) – (Contrato de Seguro. Rio de Janeiro: Forense, 1999. N. 246. P. 307).

 

O mestre acima citado, a propósito de mostrar a obviedade do princípio indenitário, assevera que de acordo com tal princípio e com as condições normais do seguro de dano, o segurado não poderá receber mais de que perdeu. A indenização não ultrapassa o valor dos prejuízos apurados. “O segurado não pode, sob o pretexto de ter pago o prêmio, receber o valor integral da apólice, pretensão que se manifesta, geralmente, quando os prejuízos são totais”.

 

A obrigação do segurador é pagar o prejuízo sofrido pelo segurado. “Nos seguros pessoais, este prejuízo se considera igual à soma fixada na apólice, porque a vida e as qualidades humanas são inapreciáveis”, também notou o Ministro em seu bem lançado Parecer. Mas, prossegue o Ministro em suas preleções doutrinárias, afirmando que “nos seguros de bens materiais, a indenização nem sempre corresponde, exatamente, à soma declarada no contrato, porque, não sendo o seguro um contrato lucrativo e, sim, de indenização, cumpre determinar qual o prejuízo que, realmente, sofreu o segurado. A soma declarada na apólice indica o máximo até o qual responde o segurador. É essa operação que se denomina liquidação do prejuízo”.

 

O caráter intrinsecamente ressarcitório do seguro de dano resulta igualmente do magistério de PONTES DE MIRANDA:

 

“No seguro de coisas, o que se leva em consideração é o valor do bem, é a diminuição ou perda desse valor, a integridade do patrimônio. Daí a necessidade de se determinar, precisamente, o valor segurável, para que se diga qual o valor segurado, afim de que, no momento do evento danoso, se indenize, dentro do valor segurado, o que sofreu de dano o bem, ou, noutros termos, o que concretamente perdeu o patrimônio” (Tratado de direito privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1964, § 4.918. n.1, t. XLV. P. 309).

 

Dever maior do segurador é o de indenizar “em adimplemento do contrato, porque contraprestou a segurança”. Todavia, “o que o segurador presta não pode exceder o dano sofrido pelo beneficiário, seja o contraente, seja outrem” (ibidem, § 4.925, n. 1).

 

Também nesse sentido buscou-se o ensinamento de SÉRGIO CAVALIERI FILHO:

 

“Há um princípio que domina todos os seguros de dano, qualquer que seja sua modalidade de cobertura: o segurado não pode lucrar com o evento danoso, não pode tirar proveito de um sinistro. A indenização deve ser necessária apenas para repor o dano sofrido, restabelecer a situação anterior à ocorrência do sinistro.

 

Vale repetir, à exaustão, que qualquer pagamento a mais, além de caracterizar enriquecimento sem causa, atuaria como estímulo à fraude ou especulação, razão pela qual a legislação de todos os países fulmina de nulidade o seguro de valor superior ao bem.

 

No mesmo Parecer, em que o Ministro ATHOS disserta sobre o tema, fazendo coro com CAVALIERI, pondera mais que “essa é uma questão de difícil compreensão para o público em geral, e que enseja constantes demandas. O segurado insiste em receber o valor estabelecido na apólice; mesmo que o valor de mercado do bem segurado seja inferior, como presentemente tem ocorrido com os veículos usados, que estão em baixa Mas, pelo fato de ter pago um determinado prêmio, não quer dizer que o segurado necessariamente receberá uma exata contraprestação. O contrato de seguro é aleatório, de sorte que o segurado, não obstante o pagamento do prêmio, pode até nada receber se não ocorrer o sinistro, ou ocorrendo o sinistro com perda parcial, receber menos do que a indenização prevista. Somente no caso de perda total receberá o “valor de mercado” do bem, ou o valor da apólice, se menor. Se o valor de mercado adotado pelo segurador não corresponder à realidade, o segurado pode demonstrar isso através de todos os meios de prova admitidos em juízo” (Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Malheiros, 1996. P. 316 – 317).

 

E nisso não diverge a doutrina estrangeira, trazendo-se à colação, por amostra, a lição do Professor AMADEU SOLER ALEU:

 

“La suma asegurada tiene por objeto fijar la responsabilidad máximum del asegurador y no crea la presunción de que los bienes segurado tienen el valor que indica la suma asegurada.  La función es estimativa, la de determinar exclusivamente un limite máximo hasta el cual responde el asegurador, pero no de que los bienes asegurados tienen el valor coincidente con la suma asegurada”(Prof. Dr. Amadeu Soler Aleu.  El nuevo contrato de seguro.  Buenos Aires: Astrea, 1969).

 

A regra, portanto, somente não se aplicaria, como alude o citado professor, nas hipóteses de vigência de cláusula de valor “tasado”.

 

Ora, nos casos de seguro facultativo de veículos automotores, o contrato-tipo afasta expressamente a possibilidade de estarmos diante de uma “apólice de seguro estimada” (a apólice de valor tasado do direito argentino), modalidade contratual esta na qual é proibida ao segurador qualquer ulterior discussão sobre o valor segurado ou do bem, pois nesses casos “pré elimina-se qualquer avaliação posterior, qualquer verificação a posteriori porque se fixou, em acordo, o valor do objeto de arte, ou de coleção, ou de pré-história, ou de história, ou o valor estimativo” (Pontes, ibidem, § 4.930, nº 5).

 

A ressalva supra, todavia, a toda evidência não se aplica aos casos em que incide a cláusula, absolutamente lícita, que estipula que a indenização relativa à perda total do bem tenha por base o seu valor de mercado, ou seja, o seu valor real.

 

Cumpre, portanto, distinguir, nos seguros de coisas, os “limites da garantia” da “medida da indenização”, por isso que garantir ao segurado uma indenização não inferior ao dano efetivo materializa o que se denomina “princípio indenizatório”, fundamental aos seguros de dano. Nada impede, portanto, que o segurado realize um sub-seguro, ou seja, uma garantia menor que a do valor do bem, hipótese em que se sujeitará à cláusula de rateio conforme prevista no art. 783 do NCC.

 

A respeito, vale reiterar o escólio de PEDRO ALVIM de que o segurado não pode receber mais do que aquilo que perdeu. A ninguém é lícito lucrar com o sinistro!  O pagamento de qualquer quantia superior, “mesmo que houvesse sido pago o prêmio, constante da prestação do segurador, desfiguraria o contrato de seguro. Seria uma especulação própria do contrato de jogo ou aposta”.

 

Se o segurado puder tirar proveito do sinistro, recebendo quantia superior à dos prejuízos que realmente sofreu, “a instituição do seguro estará, então, comprometida, pois o risco deixará de ser uma eventualidade temida para tornar-se um estímulo ao enriquecimento do segurado”.

 

O Princípio fundamental do direito securitário, em matéria de seguros de dano, é, portanto, a função indenizatória, como dispõem os artigos 757, 778, 781 e 782 do Novo Código Civil.

 

Por essa razão, quer nos parecer impertinente, anacrônica e, sobretudo antijurídica recente Medida Liminar concedida em Ação Civil Pública promovida contra a SUSEP, determinando a oferta obrigatória do seguro de automóvel por Valor Determinado.

 

Prescreve o at. 778 em apreço que nos seguros de dano a garantia prometida não pode ultrapassar o valor do interesse segurado no momento da conclusão do contrato. Escapou todavia do legislador a oportunidade de uma melhor atualização do dispositivo diante da prática de mercado que de há muito admite apólice com valor de novo ou de primeiro risco absoluto, pela qual se paga indenização, não pelo valor depreciado do bem, mas o de substituição das maquinarias pelo valor de novo, ou, no seguro de automóvel, pelo valor da nota fiscal no seguro de veículo zero quilômetro em caso de sinistro que ocorra em um curto espaço de tempo, não longo, após a sua aquisição.

 

Como estamos diante de um contrato de seguro de dano, de indenização, portanto, mister enfatizar que ao segurado não é dado visar qualquer lucro, devendo por isso receber do segurador o valor exato dos bens destruídos, se não realizou um sub seguro, caso em que se submeterá aos efeitos da cláusula de rateio. PEDRO ALVIM, ao comentar o dispositivo que acolhe a cláusula de rateio (NCC, art. 783) quando o Código ainda estava sob a forma de projeto de lei mas já a salvo de alterações, traz à colação, ensinamentos seus e da doutrina francesa, representada pelo magistério de MICHEL LIARD, reafirmando o grande princípio que domina toda a matéria do seguro de dano, segundo o qual a indenização não pode ensejar ao segurado, vítima do sinistro, um enriquecimento, já que o seguro não foi concebido para financiar lucro, mas para repor prejuízo nos limites do contrato, podendo receber indenização menor ou igual ao prejuízo, mas nunca, em hipótese alguma, superior a ele. O princípio indenitário é principio essencial e tão antigo quanto o próprio seguro, tanto que povoa todas as legislações, aparecendo atualmente como um traço fundamental do seguro de dano, este que é uma garantia de conservação, não de aquisição (in Assurance Maritime et Assurance Terrestre – págs. 117 e 120).

 

 

Note-se que a “garantia prometida”, a que alude o art. 778 do NCC, é a “importância segurada” antes fixada nas apólices, ou em mais adequada terminologia, o “limite máximo de garantia”, e o “interesse segurado” é o objeto da cobertura, que não se confunde com o bem, com a coisa segura. Tão rigoroso foi o legislador que ameaça com ação penal qualquer tentativa de se ultrapassar esses limites desde o momento da contratação, ou seja, da conclusão do contrato.

 

O caráter indenitário dos seguros de dano, e daí esses rigorosos limites estabelecidos pelo legislador como intransponíveis, tanto para a conclusão do contrato quanto para a liquidação do sinistro, tem o efeito didático e moralizador de não permitir que o sinistro possa interessar, como no jogo e na aposta, ao segurado. Ora bem, no jogo e na aposta, o evento futuro e incerto é ardentemente desejado pelo apostador, por isso que o prêmio aí tem sentido inverso do prêmio empregado no contexto do seguro; naquele, o prêmio é futuro e pago pela banca do jogo, neste o prêmio é a rigor antecipado e pago pelo segurado, que não é nem pode ser apostador. Enfim, no seguro, ao contrário do jogo, o evento futuro não é, não deve e nem pode ser desejado pelo segurado, posto que ninguém, em condições normais, iria desejar um dano, um prejuízo, uma morte, um acidente etc.

 

Conclua-se, assim, que a garantia prometida, que deve ser entendida pelo seu conteúdo econômico, seria a IS (“Importância Segurada”, expressão não mais usada posto que imprópria, até porque o novo Código não se refere mais a valor mas sim a limite), o LMI (“Limite Máximo de Indenização”, que segundo a terminologia do Código mais corretamente seria o LMG, ou seja, “Limite Máximo de Garantia), e o interesse segurado é o objeto da cobertura, do contrato de seguro mesmo, consoante o art. 757, vale dizer, a relação lícita de valor econômico sobre o bem ameaçada pelo risco. O art. 778, tal como agora posto, afasta qualquer possibilidade de lucro por parte do segurado como conseqüência do sinistro, pois o seguro destina-se exclusivamente à recomposição do patrimônio do segurado, vis a vis o prejuízo decorrente do sinistro nos limites da apólice, possibilitando ainda, além da perda do direito conforme art. 766 (declaração inexata e omissão), ação penal paralela, em caso de má-fé do segurado visando o enriquecimento ilícito ou sem causa. Exige-se também aqui a boa-fé. Note-se que a legislação de combate ao crime de “Lavagem de Dinheiro” (Lei nº 9.613/98 e Circular SUSEP Nº 200/02) insere, dente outros, como indício de suspeição de tal delito, o fato de o segurado indicar, na conclusão do contrato, valor consideravelmente maior do que realmente vale o bem que pretende segurar.


Emerge do art. 778 – que se refere ao marco inicial do contrato e veda o chamado sobre-seguro no momento de sua celebração – que cabe ao segurado, não à seguradora, ali indicar o valor correto do bem, pois cabe a ele avaliar corretamente o seu valor econômico, valor esse que, nada obstante, deve ser policiado pela seguradora.

 

Tenha-se em conta, todavia, e daí não se pode tirar razão de TZULRINIK, CAVALCANTI E PIMENTEL in Contrato de Seguro de acordo com o NCC, quando afirmam que “O art. 778 objetiva assegurar que o contrato não contenha desproporção entre o valor do interesse segurado e o da garantia. Mantém-se o equilíbrio entre as prestações, a comutatividade inerente ao princípio social do contrato e previnem-se desvios ao princípio indenitário…O equilíbrio é exigido desde quando da conclusão do contrato.”

 

Já o

art. 781 do Código Civil, vale enfatizar, cria dois limites: o do valor do interesse segurado no momento do sinistro (valor do próprio prejuízo) e, em hipótese alguma, o valor do interesse segurado fixado na contratação conforme o art. 778, salvo em caso de mora do segurador, hipótese esta última em que, se ocorrente, aplicar-se-á o art. 772, segundo o qual, “a mora do segurador em pagar o sinistro obriga à atualização monetária da indenização devida segundo índices oficiais regulamente estabelecidos, sem prejuízo dos juros moratórios”.

 

De sua leitura, verifica-se, à saciedade, cunhado de forma indelével o princípio indenizatório do seguro de dano, sem o qual não poderia cumprir sua função social, havendo daí de ser interpretado de forma teleológica, para impedir sim indenizações que ultrapassem o efetivo prejuízo experimentado pelo segurado no sinistro e em hipótese alguma o limite máximo de garantia estabelecido no contrato. Mas não para impedir, desde que com previsão no contrato, a indenização por valor de novo, que embora possa parecer ultrapassar o valor do interesse segurado no momento do sinistro, em verdade com ele se afina, na medida em que compensa, em certos casos, a defasagem do valor atual do bem sinistrado, que representa o valor em risco no dia e local do sinistro e que, nada obstante, leva-se em conta o seu custo de reposição, excepcionando-se a sua depreciação pelo tempo, uso ou desgaste, porém com as limitações pertinentes e considerando a defasem tecnológica de determinados bens, como por exemplo sucede no frenético mundo da informática, onde a substituição de um equipamento torna-se muitas vezes difícil ante a recíproca velocidade com que se evolui a sua tecnologia e por conseguinte o seu obsoletismo.

 

Não é só por isso, mas também porque não se deve confundir a cláusula Valor de Novo que imponha uma obrigação ao segurador, com a faculdade de o mesmo repor a coisa ou de reconstruí-la, com a opção de pagar em espécie. É cláusula que, aceita na maioria da legislação dos povos, tem por objetivo restabelecer a relação de identidade do segurado, em determinado espaço de tempo bem menor que o da vigência da apólice, com a coisa sinistrada por perda total, que no seguro de automóvel garante a “lua de mel” do segurado com o seu carro zero quilômetro, garantindo-lhe indenização pelo valor da nota fiscal e com a qual possa o segurado adquirir um carro novo igual ao perdido no sinistro, até em face da desvalorização irreal que ocorre com o veículo zero quilômetro nos primeiros meses da saída da concessionária, por isso que, longe estaria o segurado da possibilidade de adquirir outro carro zero com o mesmo valor da indenização baseada na tabela daquele mesmo carro usado.

 

Por isso é que, tratando-se a cláusula de Valor de Novo de um critério excepcional de indenização, que deve ficar submetida à livre manifestação das partes em contratá-la – do segurador em concedê-la e do segurado em aceitá-la -, e não ao arbítrio de normas infra-legais, já que se trata de direito patrimonial e disponível, cuja regra posta no dispositivo em comento admite ser excepcionada pela livre vontade das partes, tanto que ali o que não pode “em hipótese alguma” ser ultrapassado é o limite máximo de garantia. Assim é que, se é lícito o interesse segurado sobre o valor de novo não restaria infringido o outro limite estabelecido no dispositivo em comento, ou seja, o próprio valor do interesse segurado no momento e local do sinistro. Nem o interesse segurado no momento da conclusão do contrato (art. 778) estaria sendo ultrapassado se desde o início estiver prevista a garantia de valor de novo, pois nele incidiria o interesse segurado.

 

Como normalmente também sucede no seguro de incêndio, onde a cláusula de Valor de Novo opera com a importante função de permitir que o patrimônio do segurado, destruído pelo fogo, seja restabelecido ao seu status quo ante, mediante a reconstrução do bem.

 

Daí porque a doutrina mais qualificada assinala “não haver enriquecimento do segurado, tampouco possibilidade, em regra, de especular com o seguro, já que com a cláusula de Valor de Novo não se trataria de um seguro de interesse sobre a substância da coisa, senão um desembolso demandado pelo sinistro, não restando afetada a correlação entre o interesse segurado e o dano” (PICARD y BESSON, secundado por ISAAC HALPERIN, in “Contrato de Seguro”, Depalma, B. Aires, pág. 314).

 

Demais disso, atesta a não menos carismática doutrina de GUSTAVO RAÚL MEILIJ, in “Manual de Seguros” – Editora Depalma, B. Aires – , 3ª edição, pág. 95, ao comentar a licitude da cláusula de valor de novo, preleciona que “Cuando se utiliza esta modalidad indemnizatoria el asegurador puede exigir que las sumas pagadas por el siniestro sean efectivamente utilizadas em la reconstrucción, reposición, o reparación de los bienes dañados, requiriendo las garantias del caso”.

 

De outra parte, insta anotar para a devida reflexão que o art. 757 do Código Civil estabelece que a garantia se prende a um interesse legítimo segurável, enquanto que o art. 781 do mesmo Código proclama a intransponibilidade do valor desse interesse no momento do sinistro pela indenização. Todavia, para excepcionar essa regra e consagrar a viabilidade da cobertura por valor de novo, como dito aceita pela legislação dos povos, há de se abstrair a ligação direta entre o interesse segurado e o valor do bem nas condições em que se encontrava, estabelecendo-se certa correspondência com o interesse, de modo a se entender que quem sofreu o dano, digamos no seu automóvel, certamente não teria que se submeter a uma reparação na funilaria com uma chapa usada, com a reposição de uma peça usada, uma pintura velha etc., o que certamente acabaria pressionando os custos da reposição pelas dificuldades de se encontrar no mercado à tempo e à hora peças no mesmo estado para a mais perfeita substituição. Daí, já que o Código perdeu a oportunidade de estabelecer as devidas e expressas exceções ao tradicional princípio indenitário para contemplar o valor de novo, os veículos fora de série, de valor histórico ou de coleção por exemplo, alternativa não resta senão a de se recorrer à interpretação já que situações como que tais são também larga e tradicionalmente aceitas pela cultura do seguro.

 

Fechado esse parêntesis respeitante à excepcionalidade da cláusula de valor de novo nesse contexto, insta prosseguir afirmando que o dispositivo em foco, pela sua clareza e precisão técnica, não pode deixar margem a antigas dúvidas, ou a ilusão de muitos que ainda acreditam, por falta de mínima orientação, que o segurador é obrigado a indenizar sempre o valor constante da apólice, quando os prejuízos são totais, não mais permitindo, portanto, dito dispositivo, aquelas noções infundadas a respeito do seguro de dano, que muitas vezes perturbam um relacionamento harmonioso entre segurador e segurado, este que supõe que o prêmio pago corresponde àquele valor indicado na apólice, antes erradamente denominado de Importância Segurada, que muitas vezes até coincidem com o efetivo valor do prejuízo. A clareza com que postos os dispositivos legais em apreço põe a nu, de uma vez por todas, que o segurado não pode lucrar com o sinistro ou com o seguro, dado seu caráter de reposição.

 

Por isso que não seria demasiado repetir que a leitura ao art. 757 do NCC, há de ser feita de acordo com os seus demais dispositivos, pois nos seguros de dano, de caráter inafastavelmente indenitário, a indenização a ser paga pelo segurador não pode ultrapassar aqueles dois limites mencionados (valor do prejuízo e limite máximo de garantia), enquanto que no seguro de pessoa é livre a estipulação de um capital segurado e possível a realização, em regra sem limites, de vários seguros sobre a vida ou integridade física de uma mesma pessoa, justamente porque, nesta última modalidade de seguro, inexiste a natureza indenizatória.

 

Os dispositivos em causa, se bem entendidos e aplicados, são inegável inibidor de fraude, pois proclamam o princípio do não enriquecimento sem causa do segurado, ao proibir que o valor da indenização ultrapasse o interesse segurado nos momentos da contratação e do sinistro. Pacificam a questão do Valor de Mercado, inexoravelmente admitido no seguro de automóvel, afastando, em regra a contratação por Valor Determinado, salvo nas exceções admitidas como dito.

 

Referidos dispositivos fixam, também, a limitação dos riscos assumidos pelo segurador, ao estabelecer que a indenização não poderá ser superior ao limite máximo da garantia fixada na apólice, salvo em caso de mora do segurador.

 

 

Aliás, o princípio indenitário sempre dominou o seguro de dano, mesmo na vigência do Código revogado, embora sem a clareza do atual, a ponto de CLÓVIS BEVILÁQUA haver proclamado que

 

“Nos seguros de bens materiais a indenização nem sempre corresponde, exatamente, à soma declarada no contrato, porque, não sendo o seguro um contrato lucrativo e, sim, de indenização, cumpre determinar qual o prejuízo que, realmente, sofreu o segurado. A soma declarada na apólice indica o máximo até o qual responde o segurador. É essa operação que se denomina liquidação do prejuízo”.

 

Daí a necessidade do levantamento dos prejuízos através do processo chamado “Regulação de Sinistro”, que ocorre mesmo sendo total o sinistro, procedendo-se a um levantamento exatamente porque não se sabe de antemão se o valor dos bens destruídos era menor, igual ou maior que o do limite de garantia: (1) se o valor dos bens for igual ou superior a esse limite, por esse valor a indenização será paga; (2) se menor, a indenização a ser paga será menor que a do limite fixado, eis que, do contrário, o segurado estaria lucrando com o sinistro; (3) se o seguro for insuficiente, o segurado receberá indenização igual ao do limite insuficientemente acordado e menor que o do prejuízo, sofrendo aí os efeitos da cláusula de rateio, conforme prevista no art. 783.

 

Enfim, o segurador responde pelo valor dos bens por ocasião do sinistro e não por ocasião da conclusão do contrato. Ou melhor, como informa a doutrina estrangeira aqui representada por PAUL SUMIEN: “a indenização variável, a única possível nos seguros de dano, deve corresponder ao valor corrente do objeto sinistrado no dia e no lugar do sinistro, sem que esta indenização possa constituir um enriquecimento para o segurado” (Assurance Terrestres – pág. 88).

 

Note-se que o valor do prejuízo, ou seja o interesse segurado, que como se disse é o objeto do contrato de seguro de dano, no qual se insere o seguro de Responsabilidade Civil, embora não seja seguro de coisa, nessa modalidade de seguro – de Responsabilidade Civil – é o desembolso pelo segurado para indenizar o terceiro. E o valor do Limite Máximo de Garantia fixado na contratação conforme o art. 778, que no seguro de Responsabilidade Civil é elástico, em HIPÓTESE ALGUMA pode ser ultrapassado, como enfatiza o próprio dispositivo em comento, uma vez balizado na apólice.

 

E MAIS SOBRE PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO COM BASE NO “VALOR MÉDIO DE MERCADO:

 

Como já vimos, a relação securitária regula-se pelo “princípio indenitário”, pelo qual os contratos de seguro não se destinam a propiciar vantagens patrimoniais ao segurado, mas sim, e exclusivamente, a garantir o ressarcimento das perdas que efetivamente tenha sofrido.

 

A eventual “lucratividade”, decorrente do recebimento de “indenização” em valor superior ao do prejuízo, seria inclusive, como já foi dito, um forte estímulo para a fraude ou a displicência, na medida em que se mostraria economicamente mais interessante para o segurado “facilitar” o sinistro (v.g., deixando o automóvel em local onde seja mais suscetível de furto) do que zelar pelo bem, mantendo as normais condições de segurança.

 

Em última análise, se um bem – um veículo, digamos – está segurado pela quantia “x”(porque valia “x” ao tempo em que foi adquirido e foi segurado), mas posteriormente, pelo uso e pela passagem do tempo, passou a valer – e o valor de um bem é dado por seu “preço de mercado”- apenas x – y, não será contratualmente cabível ao segurado exigir aquele plus, exigir vantagem decorrente do infortúnio. Se permitida tal conduta, estariam rompidos os pressupostos atuariais básicos do contrato securitário, imputando-se ao “fundo comum”, gerido pela seguradora, um gravame inaceitável, ante a inevitável e sempre crescente sucessão de casos de fraude.

 

Desvios do princípio indenitário são inaceitáveis para o bom andamento e até viabilidade da instituição do seguro, pois o segurado percebendo que ganharia mais com o sinistro do que com a venda de seu veículo no mercado de automóveis, iria preferir “vendê-lo” à seguradora. Houve quem mencionasse o seguinte e descabido slogan de venda para o seguro de automóvel por Valor Determinado: “troque seu carro velho por um novo, faça seguro por valor determinado…”

 

Na doutrina italiana, o Professor AURÉLIO DONATO CANDIN sublinhou a absoluta necessidade de preservar, em seu rigor, o princípio indenizatório, no caso imprescindível para melhor se compreender o alcance da contratação por valor de mercado e não por valor determinado:

 

“Il principio indennitario, quidi, previene la degenerazione della funzione del contratto, ipotizzabile nel caso in cui esso, envece di essere strumento di riparazione della lesione di interessi patrimoniali, provochi l’eliminazione dell’interesse dell’assicurato a che la lesione non si verifichi o addirittura il sorgere di un suo interesse al veriricarsi della lesione stessa” (Responsabilitá civil e assicurazione, Milano”Egea, 1993, p. 113 – Citado pelo Ministro ATHOS GUSMÃO CARNEIRO em trabalho sobre o tema publicado na RT-769-NOVEMBRO/99 – ANO 88 – p. 120-134).

 

Na doutrina espanhola, oportuno trazer à citação o magistério do Professor LUIS BENITEZ DE LUGO REYMUNDO:

 

“El seguro no puede ser nunca uma  ocasión de beneficio par el asegurado, sino una indemnización de las pérdidas materiales, reales que haja experimentado: por consiguinte, las sumas aseguradas, las primas pagadas y las designaciones y evaluaciones consignadas en la póliza no pueden ser aducidas por el asegurado  como prueba o  reconocimiento de la existencia y del valor de los objetos asegurados, sea en acto del seguro  o en el  momento del incendio”.  (Tratado de seguros, Madrid: Reus, 1955, V. 2, p. 7 Citado pelo Ministro ATHOS GUSMÃO CARNEIRO em trabalho sobre o tema publicado na RT-769-NOVEMBRO/99 – ANO 88 – p. 120-134).

 

Cumpre, no entanto, novamente ressaltar que a fixação de um valor “absolutamente determinado”, a ser sempre e necessariamente pago no caso de perda total do bem segurado, é excepcional: limita-se geralmente, àqueles casos de bens que não desvalorizam, v.g., quando é objeto de seguro um bem de valor histórico, uma obra de arte etc.

 

Como bem advertiu o clássico CARVALHO SANTOS, aliás escrevendo ao tempo em que o uso do automóvel limitava-se a pequeníssima parcela da população: “Cuidando-se de “valor estimado”, tal como ocorre no presente, vale a lição de GIANGUIDO SACALFI:

 

“La cosa deve essere valutata com riferimento al momento in cui si verifica il sinistro. Anche questa regola é espressione del principio indennitario. Verificato il sinistro, l’assicuratore per determinare l’indennitá deve atenersi ad essa. Questo significa che la dichiarazione del valore compiuta dall’assicurato nella fase della stipolazione non puó essere da lui invocata per stabilire l’ammontare della indennitá (art. 1.903, 3ª comma.c.c.)…” (I contratti di assicurazione – L’assicurazione danni. Torino: Utet, 1991, p. 203).

 

 

 

Aliás, sempre decidiu o Augusto Supremo Tribunal Federal que: “O segurador responde pelo valor dos objetos segurados por ocasião do sinistro e não por ocasião da conclusão do contrato, pois o fim do contrato é proporcionar ao segurado indenização pelos prejuízos provenientes do sinistro sofrido…” (Recurso Extraordinário nº 8.992, publicado na RF nº 122, página 107).

 

Tzulrinik, Cavalcanti e Pimentel, não trepidam em afirmar que “Para evitar o enriquecimento injustificado, desnaturando o contrato de seguro, o art. 781 proíbe a indenização por montante excedente ao valor do interesse segurado, apurado este no momento do sinistro. O desvirtuamento ocorreria em prejuízo da totalidade dos consumidores e, muitas vezes, poderia caracterizar crime (lavagem de dinheiro) ou potencializar crime contra a economia popular – insuficiência de reservas”.(in Contrato de Seguro de Acordo com o Novo Código Civil).

 

Não obstante ser o do momento da conclusão do contrato o valor do interesse segurado que se levou em conta para o cálculo do prêmio, a norma exige que a equivalência entre a indenização e o interesse se estabeleça computando, no máximo, o valor atual deste, isto é, o existente no momento do sinistro, ou melhor, o do momento imediatamente anterior à ocorrência do dano (ib idem).

 

“Caso imediatamente antes do sinistro o interesse valha menos do que valia no momento da celebração do contrato, não poderá a seguradora senão indenizar o segurado até no máximo aquele primeiro valor” (ib idem).

 

Tudo isso porque O PRÊMIO NÃO É FUNÇÃO ÚNICA DO VALOR MÁXIMO DA INDENIZAÇÃO. Ademais, “a coletividade de segurados não se une, através de contribuições de prêmios para a formação do fundo comum administrado pela seguradora, para praticar jogo que possa premiar alguns, mas sim, para propiciar garantia em benefício de todos. Essa a função social do seguro”, assinalam, na mesma obra, os autores logo acima citados.

 

Reitero, com SÉRGIO CAVALIERI, verbis, “que qualquer pagamento a mais, além de caracterizar enriquecimento ilícito e sem causa, atuaria como estímulo à fraude ou especulação, razão pela qual a legislação de todos os países fulmina de nulidade o seguro de valor superior ao bem… Então, se por alguma circunstância, o valor do bem, no momento do sinistro, for inferior àquele pelo qual foi segurado, a indenização terá por limite o seu valor de mercado, e nada mais(…)”.

 

Nesse contexto vale ponderar, com GUSTAVO MIGUEZ DE MELLO, observando trechos de peças processuais por ele subscritas na Ação Civil Pública nº 99.001.16396-3 (7ª Vara de Falências e Concordatas da Capital do RJ), que o seguro costuma ser contrato de massa, por isso que a regularidade do sinistro só ocorre quando são muitos os segurados, imperando a lei dos grandes números. Tanto que se a seguradora contratar apenas dois segurados, o prêmio ficaria antieconômico ou a seguradora quebrará se ocorrer o sinistro. Ao passo que realizando a operação com um grande número de contratos e segurados torna-se impossível para a seguradora evitar a fraude, pois seria muito difícil para ela provar que o segurado tinha intenção de favorecer o roubo ou furto, digamos do automóvel seguro. Daí a técnica mundialmente adotada na sistemática do seguro de estimular-se o interesse do segurado em evitar a ocorrência do sinistro fazendo com que dele não resulte qualquer benefício para o segurado, razão pela qual o legislador estabeleceu os limites intransponíveis dos artigos 778 e 781, como também vedou o duplo seguro no art. 782.

 

Ao comentar o art. 1.437 do Código revogado, CLÓVIS já prelecionava afirmando: “Quem assegura uma coisa por mais do que valha, desnatura o contrato de seguro, e faz presumir a intenção dolosa de lucrar o seguro pelo sacrifício do objeto segurado. A mesma intenção dolosa revela aquele que segura o objeto na sua totalidade, mais de uma vez…” (Livraria Francisco Alves, 10ª edição, 1957. V. 5, p. 153)

 

Desrespeitar o princípio indenitário no seguro de dano é cometer grave ofensa pelo menos aos artigos 778, 781 e 782 do novo Código. Por isso também que nos contratos de seguro privado, em que se estipulam prêmios com base em critérios atuariais e estatísticos, presume-se – vale sempre repetir – que os valores respectivos foram calculados e fixados em relação às probabilidades de o sinistro vir a ocorrer, tendo em vista uma ampla massa de riscos homogêneos que levam em conta freqüência, severidade, regiões de risco, perfil do segurado etc., onde o sistema de controle das operações, dentre outros fatores, provisões técnicas, margem de solvência, limitam o lucro do segurador, não havendo espaço para se atribuir ao segurador sequer a chamada “extrema onerosidade”, tampouco o enriquecimento a expensas do segurado, de modo a justificar a inclusão da indenização pelo valor de mercado no rol das cláusulas contratuais abusivas, como desavisadamente o fez a Secretaria de Direito Econômico em uma ou duas de sua portarias.

 

Demais disso, há um fato novo e de grande relevância: a apuração do valor de mercado do automóvel pela UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, por meio da FIPE e de sua conceituada e fidedigna tabela com a qual se pode, precisamente, conhecer o valor do veículo segurado por ano, modelo, marca, região etc., em qualquer momento, inclusive no do sinistro, dando segurança a segurados e seguradoras no pagamento de indenizações de seguros. Tanto assim que o referido valor é também utilizado para outros fins, como por exemplo o pagamento do IPVA.

 

Creio comportar no contexto do art. 781 do NCC, um flash back do quanto escrevemos após a edição de nossa obra Direito do Seguro no Cotidiano (Editora Forense), em complemento sobre o tema que ali abordamos por mais de uma oportunidade, por ocasião em que o Superior Tribunal de Justiça decidiu, equivocadamente a nosso ver, sobre a cláusula de valor médio de mercado, em decisão de sua 2ª Seção, em 22 de setembro de 1999, uniformizando a jurisprudência das 3ª e 4ª Turmas contrariamente à referida cláusula, decisão essa que provavelmente teria outro desfecho se já vigente o Código Civil de 2002, com a clareza nuclear de seus arts. 778, 781 e 782. Senão vejamos os nossos comentários de então:

 

“SEGURO DE AUTOMÓVEL – AINDA O VALOR DE MERCADO. O ENTENDIMENTO DO STJ.

 

Já dissemos, em diversas oportunidades, que o seguro de automóvel se insere na categoria de seguro de dano, eis que (ao contrário do que sucede no seguro de vida onde o valor da importância segurada sempre coincidirá com o capital a ser pago ao beneficiário já que a vida humana é de valor inestimável) seu objeto – o interesse legítimo sobre o automóvel – como bem material que é , não pode, de forma alguma, se arredar do caráter indenitário do denominado seguro de coisas, este que, por sua vez, inadmite possa o segurado receber por conta de um sinistro valor superior ao dano efetivamente experimentado, sob pena de se estar propiciando a pecha do enriquecimento sem causa e, o que é bem pior, fomentando a fraude, esse voraz arquiinimigo da instituição do seguro, e transformando o sinistro em objeto de desejo do segurado, como sucede no jogo e na aposta.

 

significa No jogo e na aposta, o evento é desejado pelo apostador, enquanto que no seguro o evento é temido e não querido pelo segurado honesto. No jogo e na aposta a palavra prêmio tem mesmo o seu sentido corriqueiro, de jubilação, recompensa, ganho, lucro. No seguro a prestação do segurado para ter a garantia de uma indenização contra o risco temido, por isso que na lapidar lembrança de DAVID CAMPISTA FILHO, no contrato de seguro o segurador é credor firme do prêmio e devedor condicional da indenização ou do capital segurado necessário para o pagamento do risco feito sinistro.

 

A decisão do STJ, que será objeto de comentário mais à frente, concessa vênia, deturpa essa relação, transformando indenização (obrigação do segurador) em prêmio (obrigação do segurado), já que o segurado estará sendo premiado – no sentido de ganho ou de lucro mesmo – pela diferença entre o valor da Importância Segurada – IS (assim impropriamente denominada eis na terminologia correta seria Limite Máximo de Garantia – LMG), que no caso representa apenas o limite máximo da indenização nos termos da lei e do contrato, e o valor efetivo do dano, representado pela cotação média de mercado do veículo sinistrado, sabido e consabido que o segurado não pagou prêmio, no verdadeiro sentido do contrato de seguro, correspondente à referida diferença, que nada mais é do que a depreciação do veículo naturalmente ocorrida entre a contratação do seguro e o sinistro. O seguro, pois, não é contrato de lucro capiendo, mas de damnum vittando.

 

Já se disse também, em demasia, que para o seguro de automóvel diversos são os fatores e ingredientes considerados para o cálculo do prêmio, dentre outros a freqüência, a região geográfica, o perfil do segurado, a marca, o ano, o modelo do veículo, e também, repita-se, a depreciação que o mesmo sofre entre a aceitação do risco e a ocorrência do sinistro, decretada pelo mercado de automóveis independentemente da vontade e deliberação do segurador, posto que pela irrevogável lei da oferta e da procura.

 

Já se viu também por óbvio, a completa inviabilidade técnica e jurídica no que concerne a qualquer pretensão relacionada com a devolução pro rata do prêmio, que em verdade seria não só um contra senso à natureza aleatória e mutualista do seguro, como também outra forma de enriquecimento sem causa por parte daquele que por essa via pretendesse se beneficiar, na medida em que se contrapõe, dentre o mais, à própria circunstância de que o segurador, como gestor do mutualismo do qual faz parte cada segurado, ao calcular o prêmio, levara em conta a progressiva desvalorização do veículo no curso da vigência da apólice, como antes mencionado e repetido.

 

Igualmente já se disse a todos os ventos, que a melhor jurisprudência, inclusive a do Superior Tribunal de Justiça até então, e, como sempre a doutrina mais prestigiosa do Brasil e do Mundo, como também a Douta Procuradoria Geral da SUSEP em memorável Parecer, sustentam a desassombrada legitimidade da cláusula de valor médio de mercado.

 

Por isso que a alternativa facultada pela Circular SUSEP 88/1999(substituía pela de nº 145/2000) para a contratação do seguro de automóvel por valor determinado, em lugar da contratação por valor de mercado, resultará em um cálculo mais elevado do prêmio, que, repita-se, não teria como fator a citada desvalorização do veículo.

 

O seguro por valor determinado, ainda que técnica e juridicamente viável à luz do Código Civil de 1916, em verdade, descaracterizaria, de certo modo, a própria natureza intrínseca do seguro de automóvel ao menos na sua forma genuína, na medida em que permite que o segurado possa receber indenização superior ao dano que efetivamente venha a sofrer, no caso representado pelo valor de mercado , com o qual o segurado poderá adquirir outro veículo equivalente ao sinistrado.

 

Na verdade, tal alternativa confere ao segurado, pelo prêmio majorado que pagará, em relação à contratação pelo valor de mercado, uma indenização complementar ao dano efetivamente sofrido em relação ao objeto estrito do seguro, no caso o automóvel, como forma de compensação de sua perda material havida no sinistro, até para propiciar-lhe como que a aquisição de um veículo mais novo ou mais valioso, atendendo, assim, a uma provável e natural expectativa, nascida com o sinistro, na mente do segurado, de mudar de marca e modelo em relação ao veículo perdido. Vale dizer, chamando à ordem o “up grade” que algumas sentenças pretensamente generosas costumam impropriamente contemplar o segurado ao conceder-lhe o pagamento da diferença a maior do valor de mercado (valor do dano), sem a contrapartida do prêmio a esse título (ao bom juiz não cabe fazer cortesia com o chapéu alheio, confundir justiça com bondade, que no caso transforma-se em maldade contra os demais integrantes do mutualismo).

 

Essa diferença excedente do valor de mercado do veículo , pois, representaria uma espécie de compensação de um dano hipoteticamente presumido, entre o material e o imaterial, como que uma verba para amenizar as agruras do sinistro em si, que se abateu sobre o automóvel do segurado, que como cantado em verso e prosa, representa a paixão do brasileiro.

 

Todavia, parece inegável que tal forma de contratação alimenta a já tão indesejadamente alimentada sinistralidade da carteira.

 

E, no exagero dessa paixão, às vezes desmedida, e na medida em que se desenha a solução de toda a controvérsia que se instaurou sobre a cláusula do valor de mercado, em prol de sua legitimidade, começam a surgir outras provocações, agora contra a idéia da eliminação da IS (Importância Segurada/Limite de Indenização), substituída pela cláusula de valor de mercado pura, ou pela cláusula de REPOSIÇÃO GARANTIDA, como já se denomina nas apólices de seguro de automóvel.

 

Começam , portanto, a despontar algumas opiniões, desavisadas é bem verdade, no sentido de que seria ilegal a contratação do seguro de automóvel sem valor declarado, por conta de interpretação isolada, por isso equivocada, do artigo 1.434 do Código Civil de 1916 (correspondente ao art. 760 do Código Civil de 2002), que, verbis, estabelece: “A apólice consignará os riscos assumidos, o valor do objeto seguro, o prêmio devido ou pago pelo segurado e quaisquer outras estipulações, que no contrato se firmarem”. (o grifo não consta do original).

 

À primeira vista até que poderia impressionar aos menos informados. Mas logo a uma leitura, ainda que rápida, do conjunto de preceitos constantes de todo o Capítulo XIV do Código Civil de 1916, no qual o contrato de seguro vem disciplinado, perceber-se-á, ictu oculi, que a expressão “valor do objeto seguro” que segundo o artigo 1.434 antes citado deve constar do contrato, não há de ser, necessariamente, um valor determinado, como soe acontecer nos contratos comutativos (contrato de compara e venda por exemplo). Jamais nos contratos aleatórios, como o de seguro, onde basta o valor seja “determinável” (note-se que no Código de 2002, art. 760, paradigma, não mais é feita menção à “valor do objeto seguro”, mas à “limite da garantia”).

 

Ao contrário, para se conciliar com o caráter indenizatório dos seguros de dano estabelecido pelos artigos 1.432 e 1437 do mesmo Código de 1916, faz-se mais consentâneo o valor não determinado em cifra, porém medido, ou determinável, pelo valor de mercado do bem a ser indenizado no exato calibre do dano ou prejuízo experimentado, já que o valor que costumava vir mencionado nas apólices como IS, sempre representara , a rigor, o LIMITE MÁXIMO DA INDENIZAÇÃO e que não tem importância preponderante no cálculo do prêmio. E assim mostrado ao segurado consumidor com clareza solar, com caracteres ostensivos e redação de fácil compreensão.

 

Mas para cortar rente qualquer dúvida que ainda pudesse restar quanto à legitimidade e legalidade de se eliminar da apólice um valor determinado em cifra, basta atentar para o que dispõe o artigo 1.462 do referido Código de 1916, segundo o qual, literis, “quando ao objeto do contrato se der valor determinado, e o seguro se fizer por este valor, ficará o segurador obrigado, no caso de perda total, a pagar pelo valor ajustado a importância da indenização, sem perder por isso o direito, que lhe asseguram os artigos 1.438 e 1.439 do mesmo Código de 1916.” (o grifo também aqui é nosso). Mencione-se, uma vez mais, que os dispositivos aqui citados, não são repetidos pelo Código de 2002, eliminando, aliás, toda essa confusão, na medida em faz referência apenas a limites de garantia.

 

Percebe-se, sem nenhum esforço hermenêutico, da clareza nuclear do dispositivo acima, ao afirmar que “quando ao objeto do contrato se der valor determinado…”, a contrário senso, que o legislador possibilita o estabelecimento de valor indeterminado ou determinável na apólice, do que é exemplo bem eloqüente o valor de mercado, até porque, o artigo 1.434 no início citado fala apenas em “valor do objeto seguro”, sem adjetivá-lo de determinado ou indeterminado, sendo pois possível a sua indeterminação, tanto pela natureza indenizatória própria do seguro de dano , quanto pela letra e espírito do artigo 1.462 do Código de 1916, este que, aliás, igualmente não se contrapõe à cláusula de valor de mercado ou reposição garantida, por isso que dito dispositivo legal apenas impõe o pagamento do valor ajustado (valor determinado), exatamente quando este for assim determinado, ou seja, combinado previa e bilateralmente com o segurador, como no caso do seguro de vida e também nos seguros de objetos de arte onde não haja no momento da contratação uma cotação de valor de mercado, até pelo valor inestimável do bem, ao contrário de como sucede com o automóvel, cujo valor de mercado é inexoravelmente de fácil apuração.

 

E pela própria paixão que o segurado, como brasileiro, tem ao seu automóvel, decerto que ele próprio sabe, invariavelmente, o seu exato valor de mercado, até pelo vasto manancial de dados e publicações a respeito.

 

Quando concluímos o presente artigo, até este ponto ainda não havia a decisão do STJ do dia 22/09/99, razão pela qual nos permitimos, em face dela, fazer os complementos que adiante se inserem.

 

A DECISÃO DO STJ DE 22/09/99:

 

Como de sabença geral, até 22/09/99, a 3ª e a 4ª Turmas do STJ divergiam quanto ao tema aqui tratado. A 3ª Turma vinha copiosa e acertadamente entendendo que o valor grafado nas apólices como Importância Segurada representava apenas o Limite Máximo da Indenização (e de outra forma não poderia ser porque assim consta desassombradamente da própria apólice), por isso que em caso de perda total o segurado deveria receber o exato valor do prejuízo experimentado, no caso representado pelo valor de mercado, vale dizer, o valor com o qual poderia o segurado adquirir no mercado de automóvel outro veículo equivalente ao que foi destruído em razão do sinistro. Tal entendimento, único correto no caso, posto que fruto da aplicação pura do princípio indenitário, essencial e natural nos contratos de seguro de dano em qualquer parte do mundo, profligava aquele outro entendimento, equivocado diga-se de passagem, que vinha mantendo a 4ª Turma daquela mesma Corte de Justiça, no sentido de que a importância grafada na apólice como limite máximo de indenização assim não poderia ser considerada, mas como valor definitivo com que a seguradora deveria indenizar o segurado, reduzindo destarte a oblívio a cláusula de valor médio de mercado, menoscabando, por conseguinte, o princípio indenitário e com isso contemplando a todo aquele que sofresse um sinistro por perda total com uma generosa indenização, acima do prejuízo efetivamente experimentado.

 

Em face da divergência entre as duas Turmas do STJ, era imperioso que houvesse a uniformização da jurisprudência daquela Corte, sendo por todos de bom senso esperado que tal uniformização se fizesse consoante o entendimento da 3ª Turma.

 

Eis que, no dia 22/09/99, de forma surpreendente, e por maioria dos Ministros presentes à Seção, deu-se o inverso, ocorrendo paga por tal valor ajustado. Isso tanto para os seguros de dano quanto para os seguros de pessoas. Nestes últimos, sempre, porque a vida e a integridade física das pessoas são bens insuscetíveis de apreciação econômica. Nos seguros de dano, quando se referir a bens cujo valor de mercado seja de difícil apuração (certos objetos de arte por exemplo), por isso que as partes podem ajustar, bilateralmente, um valor prévio que representará a indenização combinada para o caso de sinistro.

 

Todavia, para preservar o princípio indenitário do seguro de dano, o espírito do legislador, encarnado no próprio artigo 1.462 (no caso data venia mal interpretado pelo STJ, exceto pelos ilustres Ministros que representaram a minoria naquele julgamento uniformizatório), garante ao segurador, nos termos do artigo 1.438 do Código de 1916, EXIGIR A REDUÇÃO DAQUELE VALOR AJUSTADO AO VALOR REAL DO BEM, SEMPRE QUE O MESMO VALOR AJUSTADO FICAR MAIOR DO QUE O VALOR DO BEM (tudo isso, repita-se, acaba após o advento do Código de 2002). E isso acontecerá, invariavelmente, em relação ao automóvel como bem naturalmente depreciável que é. Daí a inspiração da cláusula de valor médio de mercado, que elimina a dispendiosa burocracia, com reflexos no custo do seguro, das constantes reduções da IS para mantê-la ajustada com o valor real do bem, cujo engenho e arte de seus mentores foram posto em cheque por aqueles menos íntimos com os fundamentos do seguro, e, nada obstante, julgam mesmo a despeito desse desconhecimento, sem ao menos se dar ao salutar exercício da pesquisa.  a uniformização da jurisprudência do STJ no sentido de como vinha decidindo a 4ª Turma, uniformização esta que, por argumentos meta-jurídicos, permita-nos mais esta vênia, manteve a interpretação inadequada que aquela Turma vinha dando ao artigo 1.462 do Código Civil de 1916 (não repetido pelo Código de 2002), como que se este pudesse, no seu verdadeiro sentido, acoroçoar tal entendimento. Muito ao contrário, pois basta atentar-se para o quanto ele dispõe, em letra e espírito, com clareza meridiana, para se inferir que tal dispositivo é completa e absolutamente inaplicável a tão errático entendimento. É que tal dispositivo nada mais faz do que abrir, excepcionalmente, uma exceção para que se dê valor determinado em certos seguros, mediante ajuste prévio entre segurado e segurador, hipótese em que a indenização seria

 

O seguro de automóvel, pois, repita-se à exaustão tal como naturalmente se repete um refrão, não tem por escopo garantir a desvalorização do bem, porém repor ao segurado o exato prejuízo que sofreu com o sinistro.

 

Todavia, a redução da Importância Segurada de que trata o artigo 1.438 do Código Civil de 1916 (alguma correspondência com o art. 782 do Código de 2002), não seria pertinente nas apólices contratadas com valor determinado de IS antes da Circular SUSEP 88/99, porque importaria em devolução pro rata de prêmio, incompatível na espécie porque, como se disse, o segurador não cobrou nenhum prêmio para que pudesse devolvê-lo, já que no seu cálculo levou em conta a desvalorização do veículo e, por conseguinte, resultando em um prêmio proporcionalmente menor.

 

E essa impositiva adequação da importância segurada ao real valor do bem se entrelaça a outros comandos imprimidos pelo legislador no Código de 1916, no seu sistema de vasos comunicantes, dentre eles o do artigo 1.437(alguma correspondência com o art. 782 do Código de 2002) que, como regra bem torneada, impede segurar-se um bem por mais do que ele valha, também por isso que inarredável o princípio indenitário do seguro de dano.

 

Em suma, a lamentável decisão proferida por maioria pela 2ª Seção do STJ, no dia 22/09/99, desferiu um golpe abaixo da cintura da instituição do seguro, causando enormes prejuízos não só às seguradoras como também e principalmente aos consumidores honestos que integram o mutualismo, na medida em que, a dano deles, inevitável será o aumento do custo do seguro, inclusive porque tal decisão, embora não tenha sido essa a intenção dos ilustres Ministros, servirá de adubo orgânico para a fraude, espécie de vitamina que irá fazer florescer uma indústria, já próspera, que só favorece os desonestos, que é a indústria da fraude, arquiinimiga da instituição do seguro.

 

Dizer que a decisão do STJ não favorecerá a fraude é desconhecer o óbvio, pois, como notoriamente noticiado, pessoas realizam seguro até para auto-mutilação, quanto mais para , no seguro de coisas, facilitar o roubo do veículo segurado atraído pela expectativa de receber um valor maior do que o do próprio bem. Realmente, como já diziam os praxistas, “quem desconhece o contexto desconhece o texto!…”

 

Ora, se o fato conhecido da desvalorização do veículo, como alhures mencionado, é, dentre outros, fator levado à conta do cálculo do prêmio, a decisão em causa acaba de consagrar o princípio do enriquecimento ilícito e sem causa, concedendo vantagem econômica a quem por ela não pagou, posto que sem a contrapartida do prêmio.

 

Tal decisão, por assim dizer, sanciona a “lei de Gerson”, também porque instila o desejo pelo sinistro, reduzindo a notável instituição do seguro à simplória condição de jogo e aposta, na medida em que todos irão preferir “vender” o seu automóvel à seguradora, de vez que, a se cumprir tal decisão, a seguradora deveria pagar valor consideravelmente maior do que o valor que fosse apurado na venda do veículo a uma agência de automóveis.

 

De qualquer forma, a decisão em tela, a contrário senso, não desvalida a cláusula de valor de mercado, desde que na apólice não contenha nenhum valor determinado, ou seja, uma Importância Segurada grafada em cifrão, consagrando, assim, a faculdade estabelecida na Circular SUSEP 88/99 (hoje Circular SUSEP nº 145/2000) de se contratar o seguro auto apenas pelo valor de mercado, como aliás o próprio artigo 1.462 do Código de 1916 admite e como algures demonstramos.

 

A equivocada decisão, pois, do STJ, que, datissima maxima venia caminhou na contramão da lógica, da razão e do bom direito, impele as seguradoras a tomar providências reativas e proativas: quanto às situações futuras ajustar-se consoante a Circular 88/99 (vigente na época), que agora surge como que um antídoto ao veneno destilado por aquela decisão, para, ou fincar-se na comercialização de apólices apenas com valor de mercado – sem nenhuma menção a valor determinado de IS – , com regras claras quanto ao critério de apuração desse valor de mercado , ou, se assim preferirem, adotar o valor determinado, com prêmio mais alto é claro, e sempre atentas à redução desse valor determinado ao valor real do bem, em sintonia com a desvalorização ou depreciação do veículo objeto do seguro, como proclama o artigo 1.462 do Código Civil de 1916. No que pertine ao passado, ao estoque de demandas, é algo que se tem de muito pensar, nem que seja para buscar uma inconstitucionalidade na decisão do STJ e buscar um pronunciamento do Supremo Tribunal Federal, decerto que por outras vias, já que nos processos específicos em que foram julgados os Embargos de Divergência não seria pertinente o recurso Extraordinário ao STF, até porque a eventual matéria constitucional não teria sido prequestionada.

 

Costuma-se dizer , como no estilo das fábulas de La Fontaine, que o caminho não é resistir, e sim coexistir. Mas aqui, vale reagir para poder coexistir!… Ou fazer desse limão, uma limonada…

 

Deve-se, de qualquer sorte, aguardar a publicação da íntegra do acórdão, para uma análise mais específica e, se dele resultar obscuridade, omissão ou contradição, caberia em tese o recurso ao próprio STJ de Embargos Declaratórios com efeitos suspensivos. Entrementes, tal recurso dificilmente teria outra função senão a de adiar os efeitos da decisão embargada, já que, no contexto, não teria efeito modificativo de mérito.

 

Não sem lembrar, ademais, de que a própria apólice costuma prever como forma alternativa de liquidar o sinistro, a indenização in natura ao segurado, ou seja, entregando-lhe outro carro equivalente ao que foi perdido no sinistro, se assim ele o desejar.

 

Finalmente, restará ao segurador, como gestor do mutualismo do qual faz parte cada segurado, chamar prêmio para compensar o rombo deixado pela decisão do STJ e, com isso, manter a estabilidade da carteira”(Rio de Janeiro, outubro de 1999/Ricardo Bechara Santos).

 

É evidente, até evidentíssimo, o equívoco da decisão do STJ acima mencionada sobre a cláusula de valor médio de mercado, decisão essa que certamente teria outro desfecho se na ocasião estivesse vigente o novo Código Civil, com a clareza solar de seus arts. 778, 781 e 782. Até porque, os dispositivos do Código revogado utilizados como fundamento dessa decisão não são repetidos pelo novo Código, como por exemplo o art. 1.462 que fazia menção a valor determinado, enquanto que o Código atual só faz referência a limite máximo de garantia, jamais a valor determinado ou a importância Segurada, não mais utilizada nos contratos, eliminando de vez eventual confusão.

 

Todavia, a jurisprudência prestigiosa de nossos mais respeitáveis tribunais, em que pese a decisão do STJ, caminha, e agora ainda mais encorajada pelos dispositivos em comento do novo Código Civil, perseverando em abono do princípio indenitário que rege os seguros de dano, e por conseguinte prestigiando a cláusula de valor de mercado, como dá mostra a ementa de recente decisão do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, dentre muitos outros julgados nesse mesmo sentido proferidos por outros tribunais estaduais:

 

“CONTRATO DE SEGURO – VALOR DE MERCADO – FURTO – FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. Constando da apólice de seguro que a indenização será no valor de mercado, trata-se de valor indeterminado, cuja fixação somente se dará quando da ocorrência do sinistro com perda total, através de pesquisa feita no mercado de veículos usados. Havendo expresso acordo do segurado sobre o valor encontrado no mercado para o veículo, não lhe assiste direito a qualquer complementação, se recebe o respectivo valor e passa a devida quitação” (Apelação Cível nº 399.973-7, julgada em 30.10.2003 – Relator JOSÉ AFONSO DA COSTA CÔRTES).

 

Vale conferir igualmente com recente jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do SUL:

 

“Contendo a apólice previsão de valor de mercado e se o segurado optou por essa espécie contratual de seguro e que encontra correspondência no prêmio fixado, improcede eventual pedido de pagamento de diferença a título de indenização…” (repetidas e recentes decisões do TJ do RGS, dente outras a da apelação nº 70004177275 – 5ª Câmara, em 20/03/2003. Relator Marco Aurélio Caminha).

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